O medo das sombras pode levar quem sofre dessa fobia a preferir viver na escuridão (Foto: iStockphoto)
Imagine cruzar na rua com uma garota linda, daquelas de parar o
trânsito. Se, em vez de se voltar para admirá-la, você começa a tremer e
a suar frio, enquanto a náusea e a opressão o invadem, então
provavelmente sofre de caliginefobia, um terror por belas mulheres.
Talvez com uma pitada de filematofobia, um medo doido de beijar e ser
beijado. Mas se, em vez disso, o que lhe dá medo são os beijos da sua
sogra, então talvez você tenha penterafobia (aversão injustificada pela
mãe da sua esposa).
A lista das fobias mais insólitas poderia continuar ao
infinito. Há quem não suporta a visão de um joelho, nem mesmo os seus
(genufobia), quem treme – e não apenas de frio – quando cai a neve
(quionofobia) e quem tem um tal pavor das sombras (erebofobia) que acaba
decidindo viver na escuridão. Outros temem os ângulos e os cantos das
casas e dos edifícios (gonofobia), um prato de sopa de verduras
(lachanofobia) ou aproximar-se de um computador (ciberfobia). Embora
bizarros, esses distúrbios existem, são sérios, podem atacar qualquer
pessoa e bloqueá-la.
“O medo é democrático”, diz Giorgio Nardone, psicólogo,
psicoterapeuta e diretor do Centro de Terapia Estratégica de Arezzo, na
Itália. “Em 20 anos de terapia, cuidei de cerca de 15 mil pacientes, dos
quais 52% são mulheres e 48%, homens. Não há, portanto, uma diferença
significativa quanto ao sexo dos pacientes, nem quanto à sua classe
social. Nem mesmo médicos e psicólogos, que quase diariamente cuidam de
pessoas fóbicas, estão a salvo da síndrome.”
Em suma, se para você fobia era algo ligado a aranhas ou serpentes,
chegou a hora de atualizar o glossário. Alguns pesquisadores tentaram
montar catálogos das fobias mais estranhas. Na internet há vários deles,
com mais de mil verbetes coletados. Infelizmente, mais que oferecer
ajuda terapêutica a quem sofre desses distúrbios, tais catálogos servem
para satisfazer a curiosidade dos leitores “sadios”.
Vida difícil
Diante de um caso de fobia bizarra, alguns riem, outros fazem piada,
outros ainda se irritam. Na maioria das vezes, porém, não há motivos
para riso. As fobias são patologias que podem tornar muito dura a vida
das pessoas acometidas. Embora alguns tipos moderados de fobia sejam
considerados apenas “tiques” da pessoa, outros incomodam e não são
aceitos ou tolerados. É difícil confessar a amigos e a conhecidos que se
tem medo de objetos e situações aparentemente tão “inócuos”. Arrisca-se
a ser tomado por um doido, um débil ou uma pessoa cheia de caprichos.
A
fobia de computadores é recente. Já o medo de relâmpagos (à direita) e
de serpentes (abaixo) surgiu em tempos pré-históricos (Fotos:
iStockphoto)
No entanto, quem sofre de um desses distúrbios não padece menos que
um claustrofóbico “normal”, ou que um ainda mais “popular” aracnofóbico
(o que tem medo de aranhas). Taquicardia, náusea, vertigem, tremores,
medo de desmaiar, morrer ou perder o autocontrole, pânico e sentimento
de aperto no peito são sintomas frequentes e comuns nos fóbicos,
independentemente dos medos que os atormentam. É comum a todos eles a
tentativa de afastar a qualquer custo os objetos e as situações que
temem. É também comum à maior parte dos fóbicos uma certa relutância em
procurar um especialista, sobretudo nos casos de fóbicos atacados por
distúrbios mais bizarros, que procuram esconder seus temores pelo tempo
mais longo possível. A tal ponto que patologias desse tipo escapam
inclusive às estatísticas médicas oficiais.
Os especialistas divergem quanto à origem das fobias. Há os que
pensam que a responsabilidade é em grande parte genética. Com efeito,
examinando o DNA de pessoas que sofriam de ataques de pânico, fobias e
outros distúrbios de ansiedade, o cientista espanhol Xavier Estivill
notou que 97% delas apresentavam uma duplicação do material genético
presente no cromossomo 15. Para Estivill, é possível, portanto, que os
genes estejam de algum modo envolvidos na origem desses medos.
Não importa qual seja sua origem, o medo é um peso que trazemos desde
sempre. Nossos antepassados pré-históricos provavelmente sofriam de
ceraunofobia (medo de relâmpagos). Foi esse instinto primitivo – quase
um sistema de alarme que alerta os sentidos e prepara o corpo para
reagir – que ensinou aos antigos a se defender deles. “O medo é a melhor
arma de sobrevivência de que dispomos”, afirma Nardone. “O problema é
se a reatividade sobe além de um certo nível, chegando a nos bloquear.”
Medos ancestrais
Nenhuma surpresa, portanto, se entre os estímulos fóbicos mais comuns
estejam o sangue, a altitude e os animais (medos que também afetavam
nossos antepassados). Entre os animais mais temidos estão as serpentes.
Como atualmente é muito mais fácil morrer num acidente de carro do que
por picada de cobra, tudo leva a crer que na nossa memória evolutiva
permaneçam traços dos perigos que ameaçavam nossos antepassados
distantes. Por trás desses medos tão específicos esconde-se com
frequência um desconforto pessoal mais sério. Por que, então, não tentar
resolvê-lo? Abordagens terapêuticas não faltam.
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